Bate e Volta - São José das Três Ilhas



Carnaval 2019, tempo de relaxar e por as pernas para o alto? Não mesmo, proposta do feriado, um desafio de mais de 100Km. Uma cicloviagem em um dia só de jornada, de Juiz de Fora, para São José das Três Ilhas. Viagem em dupla, eu e meu irmão Danilo.

O roteiro original não era bem esse, idealmente, iríamos descer a BR-040 rumo a Belmiro Braga, e depois retornar por Sobragi e subir de volta a BR-040. Mas durante a revisão das bikes na oficina, conversando com o dono da loja, ele propôs "Cara, aproveita e vai para São José das Três Ilhas, quem faz 75Km faz 100", cheguei em casa e conversei com Danilo que topou imediatamente, então o passeio tomou outra dimensão. O relevo da região é severo, próximo da Serra da Mantiqueira, o que implica que 100Km aqui tem que ter preparação, pois se tem 50Km de descida terá 50km de subida. 

Resolvemos seguir a sugestão do dono da loja, de fazer a volta de Belmiro Braga, um trecho de terra que vai de Belmiro direto para São José, depois saindo pelo outro lado da cidade indo em direção ao Rio Preto, na divisa dos estados de Minas Gerais com o Rio de Janeiro, um trecho plano de 11Km beirando as margens do Rio Preto, e voltando para Belmiro Braga. Mas isso tudo com o pequeno detalhe, partimos de Juiz de Fora, e voltaríamos para origem no mesmo dia.

Com objetivo de vencer o desafio imposto pelo relevo e a distância, nos preparamos com bastante alimento armazenado em uma bolsa no bagageiro traseiro da minha bike, e cada um com capacidade de carregar mais de 2 litros de água. E para quem tem curiosidade sobre o cardápio, a foto mostra o Menu preparado, e ainda estava previsto um almoço em São José.



A aventura começa cedo, com tudo meio preparado no dia anterior, acordamos às 5:30, para dar aquela ùltima ajeitada nas magrelas, tomar um cafézinho e zarpar. Hora de partida 6:15. Já no início nos deparamos com uma bonita cena, no mirante de JF, que rendeu essa foto:

Ainda tinha que descer lá para as nuvens. (Frase estranha, mas  que aqui se aplica)




Descendo a Br-040 sentido Rio de Janeiro, pegamos a MG-353. Logo após a Fazenda São Mateus, fica o trevo para Belmiro Braga, era a primeira vez pegando a estrada para Belmiro, e imaginávamos que seria só descida até lá, puro engano, também tinha morro para subir lá. Chegamos na entrada de Belmiro às 8 da manhã, na bifurcação para São José. O tempo continuava nublado até esta hora, e impomos um ritmo mais acelerado enquanto não tinha sol, mas neste ponto a fome já estava dando avisos, partimos de casa com a barriga forrada, mas nessa hora já estavamos procurando algum lugarzinho para uma pausa mais longa, para descansar e comer. Acessando o trecho para São José, uma estrada de chão bem conservada, começamos a procurar um cantinho para lanchar. Cerca de 2 Km depois, encontramos uma curva na mata, bem tranquila, com uma abertura legal para estacionar as bikes. 

Selfie dos mano.


O percurso é cheio de paisagens bem vislumbrantes, com serras e cachoeiras à vista. Existem várias fazendas antigas no caminho, que no século XIX eram responsáveis por girar a economia cafeeira local. Quanto mais perto de São José, mais longe no passado nos encontrávamos.


Entrada do arraial, a Igreja de São José sobressai na paisagem.
Igreja símbolo da cidade.

A essência de Minas em sua arquitetura.

 Paramos na pousada em busca de almoço, antes de entrarmos apareceu um coroa carioca cheio de onda, jeito carioca, o sujeito estava refugiado no arraial durante o carnaval, segundo ele "É assim que eu pulo o carnaval, chega na semana do carnaval, eu pulo direto para próxima",  um carioca diferente esse. E ele foi contando a vida, escalador, cobre a região catalogando as trilhas de escalada e pedras para o anuário fluminense de escalada.
 Achando que ia ter comida pronta 11 da manhã, quebramos a cara, o rango não estava pronto, e então foi hora de aproveitar a espera para conhecer o arraial. Deparando com uma placa na rua dizendo "Quitutes da Cida - Açaí" o estômago falou mais alto, perguntamos então para um transiunte onde ficava o tal açaí. Cláudio, muito simpático, e também carioca, foi nos guiando até o trailer do açaí que fica no campo de futebol. Enquanto isso foi apresentando a cidade (a rua principal), e nos conduziu até  o trailer onde comemos um açaí do bom, e lá também vende pastel com massa feita lá mesmo, mas como estava muito cedo ainda não tinha. Então já sabem onde procurar o açaí, é só achar o campo de futebol. 

Após o almoço, veio a hora de partir.  Uma longa jornada de volta, cruzando a cidade e saindo na saída para o Rio Preto, num trajeto plano de 11Km,  à incríveis 360m de altitude, só para comparar, Juiz de Fora fica à 900m (bairro São Pedro, nossa origem).

Neste trecho, aconteceram 2 encontros animais, o primeiro muito tranquilo, tinha uma cascavel esticada na rua, pedindo para ser fotografada. Sim, a cascavel foi o encontro tranquilo, o pior estava por vir.  Um garrotão de Nelore (aquele boizão branco de calendário de açougue) estava na rua e se assustou com nossa presença, correndo à frente na expectativa de encontrar um buraco na cerca para voltar para o pasto, e nisso um carro apontou no outro sentido, buzinando para afastar o garrote perturbado,  nisso o animal se sentiu ameaçado e acuado, e se voltou contra mim, o Danilo estava uns 20 metros atrás de mim, e eu fiquei próximo de um barranco com cerca, o garrote parou à 3m de mim em posição de ataque, bufando e raspando o chão, e nessa hora pensei " já era pra mim". Com a bike feita de escudo, e encarando o bichão olho no olho, tive que pensar rápido, joguei a bike contra ele e pulei feito um macaco para cima do barranco, me agarrando na cerca e pulando ela de qualquer jeito. O animal se assustou quando joguei a bicicleta e viu oportunidade de fugir, excelente escolha. Danilo também pulou a cerca, um tempo antes de mim, afinal estava mais longe.

Me estrupiei nessa manobra, furando a calça e o joelho no arame farpado, o óculos também se perdeu nesse pulo. O cara do carro, um uno way vermelho, veio conduzindo numa boa, que raiva daquele sujeito, mas peguei a bike e corremos o mais rápido possível para ganhar distância daquele animal, afinal, vai que ele resolvesse voltar. 

A moral da história é que sempre devemos estar preparados, pois nesses locais ermos, os animais são mais ariscos, e a visão de um ciclista não é nada natural para eles. Uma pitada de azar e nos damos de cara com um bicho mal humorado, uma receita perigosa. Então atenção para as aventuras, e mais atenção quando avistar esses nelores, que pelo menos aqui na minha região são considerados animais bem temperamentais, o gado de leite é tranquilo agora esses nelores são traiçoeiros.  

Passado o susto, a viagem foi em tom de temor até que se chegasse no acesso à Belmiro Braga. E quase chegando lá, uma coisa curiosa, nos deparamos com um vizinho da rua, de Juiz de Fora, caminhando pela estrada, o Marquinho, que também é ciclista, então tivemos que parar para conversar um cado com ele, que estava lá em Belmiro curtindo o carnaval. 

Belmiro foi para uma pausa mais longa, deitando na praça, ao ritmo de axé com o trio elétrico fazendo testes de som. Saindo de lá por volta de 16:30, havia muito chão, mas o resto seria só asfalto.

Chegando na MG-353, às 18 horas, a noite se fez presente. E nessa altura as pernas já estavam reclamando, assim como as nádegas, castigadas por 85Km de atrito. Como um amigo diz: "pra pedalar longe tem que calejar a bunda", frase meio estranha, admito.

Logo após a Fazenda São Mateus, a subida já castigava, e as pernas do Danilo abriram o bico, então empurramos as bikes por uns 2.5Km morro acima. Destaque para as luzes de sinalização, de extrema importância, afinal a estrada é sem acostamento, e a noite o risco é real, se fazendo necessário ser visto.

Ao chegar no final da MG-353, próximo ao trevo com a BR-040, fizemos uma parada no portão do depósito da U&M, e ficamos lá deitados no pátio, um bom tempo para descansar. Depois foi "só" subir a BR até em casa, e o épico percurso se encerrou à 22:45 com 120,2Km percorridos, sendo nosso recorde pessoal e também a primeira vez que rompemos a barrreira dos 100Km.




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